segunda-feira, 5 de maio de 2014

Bases bioquímicas da hereditariedade

por Fabio Dias Magalhães




Bem...mais um texto longo. A nossa pergunta é: Qual é a base química da genética?

Considere um casal de indivíduos não albinos que tiveram um filho albino. Esse é um tipo de assunto comum em aulas de genética. A partir da história concluimos que os pais eram hererozigotos (Aa) e o filho homozigoto recessivo (aa):


Vários conceitos estão envolvidos com o heredograma:

1)"A" e "a" são alelos de um gene, ou seja, variantes de um gene. O alelo "A" está relacionado com a produção de melanina, já "a" não produz esse pigmento. Isso mostra que o gene interfere nas características de um indivíduo.

2) Cada um dos pais transmitem  um dos seus alelos ("a" e "a") ao filho ("aa") na fecundação. Isso mostra que uma característica é condicionada por par de alelos que se separa na produção de gametas. E que o gene tem capacidade de replicação, já que a partir de uma célula (zigoto) se desenvolveu o filho, e o genótipo "aa" se replicou para todas as suas células.


Em resumo: um gene interfere nas características de uma célula e ele tem capacidade de replicação e, por isso, é transmitido para células filhas.


Nosso objetivo aqui é entender que um gene é um trecho de DNA que expressa um peptídeo ou proteína. Esse DNA replica e isso permite que as informações para síntese de proteínas sejam transferidas para as células filhas. Durante a replicação, o DNA pode sofrer mutações e por causa disso existem variantes de um gene (alelos) que produzem proteinas diversas cada um, com ou sem atividade biológica.

3 características de um gene: Uma característica (melanina) resulta de um par de alelos (1), que podem ser transferidos para células filhas (2) e esse par de alelos se separa na produção de gametas (3).




Questão: O DNA é a molécula da hereditariedade por apresentar duas propriedades.  Cite-as, explicando sua importância.



Resposta:  Transcrição e replicação. A transcrição é uma etapa da síntese proteica e, a partir dela, o DNA comanda o metabolismo celular através de enzimas e outras proteinas. A replicação permite que as informações para a síntese proteica sejam transmitidas para as células filhas, sendo por isso uma etapa anterior à divisão celular.
Acima, o DNA transcreve (o que permite a síntese de proteínas) e replica ( o que permite a divisão celular)


DNA, RNA e Proteínas

O DNA e o RNA são ácidos nucléicos e, por isso, polímeros formados de  nucleotídeos.  O DNA é feito de desoxirribonucleotideos (com desoxirribose e bases nitrogenadas A, G,C e T) e o RNA é um polimero de ribonucleotídeos (com ribose e bases nitrogenadas A,G,C e U). São moléculas bem diferentes das proteínas, que são polímeros formados de aminoácidos unidos por ligações peptídicas.
Ácidos nucleicos são compostos de nucleotídeos. Na figura acima, observe os dois tipos de pentose (ribose e desoxirribose) e as bases nitrogenadas pirimidinas e purinas. Qual pentose e base nitrogenada é exclusiva do DNA?


A partir do DNA são transcritos vários tipos de RNA: O RNA que leva a mensagem do DNA (RNA mensageiro), o RNA que transporta aminoácidos  (RNA transportador) e o RNA que compõe com proteínas os ribossomos (RNA ribossômico). Entretanto, quando falarmos aqui de transcrição estaremos nos referindo à produção do RNAm. 




Proteínas são compostas de aminoácidos. Abaixo, um aminoácido, componente das proteínas. Observe os grupos amina, carboxila e a cadeia lateral (grupo radical).


Na síntese proteica, aminoácidos se ligam, processo que libera uma molécula de água para cada ligação peptídica:

Resumo da  síntese protéica

A síntese protéica tem duas etapas: transcrição e tradução

Na transcrição, um molde de DNA produz um RNA  mensageiro (RNAm).

Na tradução, esse RNAm, ligado a ribossomo, será molde para a produção de proteína.

O ribossomo se desloca sobre o RNAm e o RNA transportador  (RNAt) reconhece as trincas de nucleotídeos do RNAm, transportando o aminoácido correto. A medida que outros RNAt vão trazendo aminoácidos, vão ocorrendo ligações peptídicas, levando a produção da proteína. Cada trinca de nucleotídeos do RNAm (codon) se parea com a trinca do RNAt (anticodon). Assim, existe uma relação de 3 nucleotídeos no ácido nucléico para 1 aminoácido na proteína. Entretanto,  existem codons  não relacionados a aminoácidos e são eles que determinam o fim da síntese proteica; são chamados de codons de parada.

As duas etapas da síntese proteica:



Um gene, uma proteína. Acima, um gene é um trecho de DNA que expressa um peptídeo.O RNAm transcrito  a partir do DNA se liga ao ribossomo, permitindo que ocorra a tradução, na qual as proteínas serão montadas.   Perceba, na figura acima, o códon, trecho do RNAm relacionado, geralmente,  a um aminoácido na proteína.




3 para 1. Acima, figura mostra a relação de 3 nucleotídeos do RNAm para um aminoácido na proteina. Essa  trinca de nucleotídeos é o codon. O ribossomo  permite a ligação dos RNA transportadores, ligados ao aminoácidos. O RNAt  reconhece o codon  através do anticodon, trinca complementar ao codon que ocorre no RNAt. A medida que o ribossomo vai se deslocando pelo RNAm  a proteina vai sendo montada.




Questão: O fumo está relacionado ao aumento de risco para o câncer de pulmão. O hábito de fumar expõe os fumantes asubstâncias com atividade carcinogênica. O Benzopireno, um dos principais agentes carcinogênicos presentes na fumaça docigarro, tem a capacidade de promover mutações no DNA levando a mudança da base Guanina para Timina. Suponha que umtrecho da fita molde de DNA do gene X, representado a seguir, possa ser alterado em presença do Benzo[a]pireno, em um dosdois sítios indicados na figura

1.Considere que o RNA mensageiro seja formado a partir das trincas mostradas no esquema da figura 1 a seguir.Indique as alterações que ocorrerão na síntese da proteína X quando a mutação for localizada nos diferentes sítios, justificando cada resposta com a utilização do código genético da figura 2.
 2.Qual seria o efeito da deleção da primeira adenina indicada no trecho de DNA da figura 1?


Resposta: 
Lembrando os sítios de mutação e o código genético...

1) Quando a mutação for localizada:
a) no sítio 1  A seqüência do DNA será modificada pelo benzopireno de ATG para ATT levando, na transcrição, a formação de um RNAm com a seqüência UAA ao invés de UAC. UAA é um códon de terminação, portanto, a mutação provocará a produção de uma proteína menor. 

b) no sítio 2 A seqüência do DNA de CCG será modificada para CCT levando na transcrição, a formação de um RNAm com a seqüência GGA ao invés de GGC. Nessa situação, a modificação de GGC para GGA não provocará alteração na proteína; os dois códons na tradução produzem uma proteína com o aminoácido glicina, nesta posição

2)A deleção da adenina alterará a matriz de leitura, levando a alteração da proteína. (explicarei isso  a frente).


A tabela acima, na questão,  ilustra o Código genético, que é a relação de trincas de nucleotídeos do ácido nucléico  com os aminoácidos de uma proteína. Ele é universal, por é obedecido pelas sinteses proteicas de todos seres vivos. Isso evidencia a ancestralidade comum de todos os seres vivos e permite, ainda, a produção de organismos transgênicos. O código genético é também degenerado, ou seja, existem mais de um codon para o mesmo aminoácido, o que nos protege do efeito de mutações como a que ocorreu no sítio 2.


O efeito das mutações

Mutação gênica é uma alteração aleatória do DNA. Ela resulta de um erro durante a duplicação por causa de uma substituição, deleção ou inserçao de nucleotídeos. A mutação pode levar a produção ou não de proteínas alteradas. 

Vamos estudar os impactos da mutação a seguir:

Leia acompanhando o quadro abaixo. As mutações estão em vermelho, o DNA e proteinas normais estão, respectivamente, em azul claro e verde. A sequencia normal do DNA produz a sequência de aminoácitos Thr-Met-Gln-Arg-gln. A troca de nucleotídeos pode ou não alterar a sequência de aminoácidos. A alteraçao de ACA para ACG não mudou a proteína. Já ACA para ATA levou a substituição do aminoácido Thr para lleu.  No outro exemplo, a alteração de CAA para TAA produziu uma trinca de parada interrompendo a síntese.  A deleção ou substituição de base altera a matriz de leitura, ou seja, enquanto antes as trincas eram ACA ATG CAA CGA CAA, a inserção de G levou a produção de trincas ACA GAT GTA ACG ACA, mudando totalmente a proteína.



Abaixo a figura mostra como inserções e deleções alteram a matriz de leitura. O DNA normal está no meio, acima ele sofreu inserção ( em bege) e abaixo deleção.


Note que é a partir das mutações que os  alelos  (variantes de genes) são produzidos. Levando em conta que a  mutação pode produzir proteínas disfuncionais, vamos chamar de "A" o trecho de DNA não alterado e de "a"  aquele trecho que sofreu mutação e por isso não produz uma  enzima ativa. Os individuos "AA" e "Aa" produzirão a enzima, enquanto "aa" não produzirá. Essa é a base molecular para os famosos conceitos  de dominante e recessivo.


Replicação e Divisão Celular

A replicação é um processo que ocorre antes da divisão celular e é fundamental para transmissão das informações para síntese proteica para as novas células.

Costuma-se dizer que a duplicação do DNA ocorre no sentido  5' para 3':



Para entender isso, observe o desoxirribonucleotídeo abaixo. Perceba que os carbonos da pentose são numerados de 1' a 5'. Observe onde estão os carbonos 3' e 5' e os ligantes desses carbonos. Existe uma hidroxila ligado ao carbono 3' e tres fosfatos no C 5':
Durante a duplicação, o grupo fosfato do carbono 5' ataca o grupo hidroxila do carbono 3' da fita de DNA nascente. Assim vai ocorrendo a polimerização do DNA, catalisada pela DNA polimerase:
 Na figura, observe o novo nucleotideo se ligando ao DNA. O grupo fostato desse novo nucleotideo reage com a hidroxila do nucleotideo que ja está no DNA, formando uma ligação chamada de ligação fosfodiester. Perceba que a nova fita cresce no sentido 5' a 3'.



A duplicação do DNA ocorre na intérfase e forma cromátides irmãs (que parecem um "X" ou um "H"). Posteriormente, no início da divisão celular, o DNA se condensa, reduzindo seu volume. Isso é fundamental para favorecer os deslocamentos que o material genético vai sofrer na divisão:



Existem dois tipos de divisão celular nos eucariotos: a mitose ( que conserva o número de cromossomos e serve para o crescimento dos animais) e a meiose ( que reduz o número de cromossomos e permite a produção de gametas animais). 

Observe, abaixo, a formação e a separação das cromátides-irmãs:



 Perceba, acima,  que na meiose 1 ocorre a separação dos cromossomos homólogos. Os genes alelos estão em cromossomos homólogos e é a separação desses que leva à segregação dos alelos.


Conclusões

Retornemos ao genótipo "Aa", que ocorre em indivíduos que produzem melanina:



1) Os alelos  "A" e "a" resultam de mutações, em ancestrais distantes. "A" produz enzima ativa mas "a" não.

2)A combinação "Aa", por causa da presença de "A" acaba por levar a produção  de  enzima funcional e, com isso, produção de melanina. "A" é chamado assim de dominante porque sua expressão ocorre tanto como "AA" ou "Aa".

 3)Esses alelos são DNA e por isso podem se duplicar e serem transferidos para as células na mitose.

 4)E como estão em cromossomos homólogos, eles se separam na meiose 1, e por isso os gametas são apenas "a" ou "A".



Ah, vida! Sobre o Projeto Genoma Humano







Saiba mais

1. Sintese proteica em eucariotos é diferente daquela que ocorre em procariotos. Isso porque As células eucariotas são compartimentadas, clique AQUI para saber mais.  A síntese proteica eucariota também é diferente porque o RNAm deve ser processado. Clique AQUI para saber sobre o SPLICING, o processamento do RNAm (EM BREVE!)

2.O câncer é causado por acúmulo de mutações. Clique AQUI para saber mais.

3. Se tiver paciencia e um caderno para ir fazendo anotações, veja essa aula de Genética e Evolução, com a maior parte do conteúdo dessas matérias em prezi e com questões.(EM BREVE)

4.A genética viral tem características próprias. Veja essa aula e faça as questões propostas.

5.Conheça os experimentos que permitiram a conclusão que o DNA é o material genético dos seres celulares (EM BREVE)

















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